História e Cultura de Palhoça-SC
Foto: acervo histórico do bisneto Arthur Nahas Neves
Nicolau Nagib Nahas (1898-1934), ilustre cidadão escritor, poeta e dramaturgo. Ancestral da tradicional família Nahas de Palhoça, nasceu na cidade de Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro a 2 de março de 1898. Filho de Nagib Nicolau Nahas, Capitão da Primeira Companhia do 174º Batalhão da Reserva da Guarda Nacional de Ubatuba, SP, nomeado em 1914 pelo Presidente Hermes da Fonseca. O pai, Nagib, imigrante sírio, nasceu em Beyruth (atual capital do Líbano), em 1868 e faleceu em Florianópolis em 1923. Casado na Síria com Jamille Malty Nahas, após viverem os primeiros anos no Estado do Rio De Janeiro, onde nasceram Nicolau e sua irmã Luiza, passaram a residir na Rua Saldanha Marinho, Florianópolis no início do século XX. Neste local possuía uma loja e fábrica de malas junto com seu irmão Miguel Nahas. Nessa época, o filho Nicolau Nagib Nahas era criança, estudou o ginásio no Colégio Catarinense onde estabeleceu vínculos culturais e profissionais.
Pais de Nicolau: Nagib Nicolau Nahas e Jamille Malty Nahas.
Foto: Acervo de Arthur Nahas Neves.
O casamento com a palhocense Carmen Hoffmann
Serventuário da justiça, Nicolau Nagib Nahas, visitava esporadicamente Palhoça, vila próspera no início do século XX, terra natal de sua esposa, Carmen Hoffmann, nascida em 24/09/1901. O matrimônio realizado no dia nove de dezembro de 1922 em Palhoça, oficializado pelo Juiz de Paz Capitão José Grathnohl Krebs e testemunhado por amigos e várias autoridades, entre eles, o conhecido comerciante palhocense Germano Berkenbrock (dados da certidão de casamento). O casório civil realizou-se na casa dos pais da noiva, o então comerciante palhocense Capitão Pedro Egydio Hoffmann, 5º prefeito de Palhoça, (1913-1914), natural de São Pedro de Alcântara e da esposa Maria Augusta Lehmkuhl Hoffmann, natural do Distrito de Theresópolis, (na época pertencia a Palhoça). Conforme informações repassadas por familiares, o local do casamento foi na Rua José Maria da Luz, onde hoje é o comércio Jaqueline Calçados. Após celebração do matrimônio, Nicolau Nagib Nahas e Carmen Hoffmann foram morar na capital de SC, onde o jovem Nicolau exercia a função de juiz de Paz da Comarca de Florianópolis.
Morte precoce de Nicolau Nagib Nahas
No auge de sua carreira como escritor e produtor cultural, ocorre a repentina morte precoce de Nicolau, aos 35 anos de idade, em 1934, no Hospital de Caridade, vítima de tuberculose. Foi enterrado no Cemitério da Irmandade Senhor dos Passos, entidade em que era associado. Teve direito ao sepultamento em jazigo da entidade com cerimônia de encomendação do corpo e missa no trigésimo dia do falecimento. Mais tarde, os restos mortais foram transferidos para o Cemitério Senhor Bom Jesus de Nazaré em Palhoça junto com a esposa.
Família Nahas em Palhoça
Com a viuvez, a esposa Carmen Hoffmann Nahas, retorna nos anos 30 para Palhoça com os seis filhos ainda pequenos. Na terra natal exerce a função de professora e bibliotecária do Grupo Escolar Venceslau Bueno. Determinada, concretizou o sonho de criar todos os descendentes formando a tradicional família Nahas de Palhoça. Carmen faleceu em Florianópolis, vítima de trombose cerebral, aos 75 anos de idade em 1º/11/1976. Está sepultada em Palhoça, no cemitério Senhor Bom Jesus de Nazaré, junto com esposo Nicolau.
Filhos de Nicolau Nagib Nahas e Carmen Hoffmann Nahas:
Edson Ruy Nahas (19/10/1924-14/03/1996)
Jamille Maria Nahas Soares(19/12/1925)
Talitha Coeli Nahas (28/01/1927)
Gilberto Pedro Hoffmann Nahas (19/06/1928-06/07/2010)
Carmen Sulamita Nahas Baasch (19/03/1930-15/06/1995)
Juarez Artur Hoffmann Nahas (18/12/1931)
Hermes D'Alincourt Nahas (1933- aprox.1934)
Família Nahas em Palhoça
Da esquerda para direita, atrás: Juarez, Gilberto, Carmen (Carmita), Jamille e Talitha;
Sentados: Edson e Carmen (mãe)
Edson Ruy Nahas, (im memorian) nasceu em 1924, casado com Zurilda Baasch Nahas (25/03/1926-22/08/2018) teve cinco filhos (Valeska, Markus Vinicius, Valkiria, Vanessa (falecida) e um filho nati-morto. Combatente na Segunda Guerra Mundial o escritor e poeta Edson Nahas morava na Rua Caetano Silveira de Matos, centro de Palhoça. Um cidadão de inestimável valor político, desportivo e cultural, participou ativamente da vida comunitária do município, fundou e presidiu o MDB de Palhoça. Deixou para a imortalidade três livros de poesias: Versos Ao Vento (1993), Filosofia De Botequim (1994) e Colcha de Retalhos (1996), também teve alguns poemas publicados na coletânia “Vozes Catarinenses”. Faleceu em 1996, vítma de câncer, foi sepultado em Palhoça. Fonte: Arthur Nahas Neves.
Jamille Maria Nahas Soares nasceu em 1925 e foi casada com Nilton Brasil Soares(09/11/1918-12/11/1969). Prestou vestibular para o então curso de Estudos Sociais da Universidade Federal de Santa Catarina, com mais de 40 anos. Trabalhou como tesoureira da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos e foi uma das fundadoras do Grupo das Abelhas Operárias de Palhoça, entidade sem fins lucrativos. Moradora da capital catarinense, Jamille realizou trabalhos voluntários durante muitos anos na SERTE, uma instituição espírita de assistência social e educação, com sede em Florianópolis. Em 2015, na véspera de seus 90 anos de idade retornou à terra natal, Palhoça. Na literatura, produziu duas histórias infantis: A Nuvenzinha Peralta (Em 2000, para seu sobrinho-neto Arthur) e A Moto (Em 2019, para seu sobrinho-bisneto Eduardo), ambos impressos apenas para a família. Fonte: Arthur Nahas Neves
Talitha Coeli Nahas nascida em 1927 e casada com Zalmir Claumann (01/11/1925-20/03/1992), com quem teve dois filhos (Rita De Cássia e Túlio). Foi professora primária no então Grupo Escolar Venceslau Bueno. Mudou-se para Florianópolis no final dos anos 90, retornando à cidade com os filhos em 2012. Participa da Associação das Professoras Aposentadas de Palhoça e do Grupo das Abelhas Operárias. Fonte: irmão, Juarez Nahas.
Gilberto Pedro Hoffmann Nahas (im memorian) nascido em 1928, casou-se com Zeli Terezinha Platt Nahas (05/10/1933-26/08/1995), com quem teve cinco filhos: Gilberto Nagib (falecido), Carlos Alberto (falecido), Sérgio Luiz, Marco Aurélio e Luiza. Foi combatente na Marinha durante a Segunda Guerra Mundial, jornalista, escritor, poeta, membro da Academia Josefense de Letras e conhecido árbitro do futebol catarinense. Fato inusitado aconteceu em uma partida amistosa no Estádio Adolfo Konder- Campo da Liga de Florianópolis, em 1º de abril de 1971. Gilberto Nahas apitou o clássico organizado pelo Governo militar do Brasil na época para comemorar o golpe – tratado como “revolução democrática” . O evento entre Figueirense e Avaí marcou história no futebol Catarinense, chamado de “Clássico da Vergonha” pois todos os jogadores brigaram entre si. O árbitro distribuíu 22 cartões vermelhos e encerrou o duelo no zero a zero, para Gilberto Nahas: “A regra tem que ser cumprida.”, mas as pressões não tardaram vindo do Governador Colombo Machado Sales (que assistia à partida) e dos Generais do Regime Militar. Entretanto, o árbitro manteve a decisão de suspender os jogadores, pois, em suas palavras: “ali dentro de campo eu era a autoridade máxima” tendo, por isso, ficado um dia preso na sede da Marinha em Florianópolis. Gilberto Faleceu em 2010 vítma de câncer e foi sepultado em Florianópolis.Fonte: NSC Total e Arthur Nahas Neves.
Carmen Sulamita Nahas Baasch (im memorian) nasceu em 1930, casada com Evaldo Muri Baasch (10/09/1929), com quem teve dois filhos: Sandra Sulamita e Saulo Muri (falecido). Carmen, ou Carmita, como era chamada por todos, foi professora primária no então Grupo Escolar Venceslau Bueno. Durante a construção e fundação de Brasília, mudou-se com a família para a Capital Federal, onde também foi professora, porém, sempre que podia vinha visitar os familiares e amigos em Palhoça. Carmita voltou para Santa Catarina na década de 70, passando a residir em Florianópolis. Junto com a irmã Jamille e membros da sociedade palhocense, fundou o Grupo das Abelhas Operárias. Faleceu em 1995, vítma de câncer e foi sepultada em Florianópolis.
Fonte: irmão, Juarez Nahas.
Dr. Juarez Artur Hoffmann Nahas, nascido em 1931, casado com Valkiria Pamplona Nahas, com quem teve cinco filhos: Jeanine Maria, Douglas, Juval (falecido), David e Karin. Foi funcionário da Marinha (1952-1969), promotor público (1969-1982), vereador (1962), escritor, colunista voluntário dos jornais Palavra Palhocense (desde a fundação até 2018), O Palhocense, O Regional, O Cambirela e Folha de Palhoça. Na legislatura do Prefeito Odílio José de Souza, criou os símbolos oficiais do município de Palhoça: Brasão e a Bandeira, conforme LEI Nº 006 e 007 de 06 de abril de 1973. O ato foi realizado em sessão solene na Câmara de Vereadores (foto abaixo).
Dr. Juarez sempre foi engajado com a política, esporte e vida comunitária. No Guarani FC de Palhoça, time onde foi jogador e presidiu algumas vezes, deu aula de futebol na escolinha do clube e no Vasquinho (fundado em 1960) para as crianças do município, gratuitamente, durante mais de 30 anos. Por sua dedicação, a diretoria do ex Colégio Carrossel instalou um parque na sede do Clube Guarani FC com seu nome para homenageá-lo, em 2001. O parque foi demolido posteriormente pelas administrações seguintes do clube. Ao assumir uma cadeira na câmara de vereadores, em 1962, pelo PTB, abriu mão do salário para exercer a vereança. Foi presidente do Clube 7 de Setembro (1961-1962) e do Lions Clube Palhoça (1973). Juntamente com o irmão Edson e outros membros da sociedade palhocense, fundou o MDB de Palhoça. Exerceu a função de secretário do Esporte, Turismo e Cultura da administração Paulo Roberto Vidal. Fundou com outros membros da sociedade Palhocense a Biblioteca Pública Municipal de Palhoça Guilherme Wiethorn Filho (1974). Também trouxe para Palhoça o Colégio Governador Ivo Silveira (1963) e conseguiu com o Governo do Estado recursos para a construção da sede do antigo Fórum Vicente Silveira de Souza Júnior (atual policlínica municipal no centro do município). Na área desportiva, junto à comunidade Católica do município, angariou recursos via ofício ao Santo Papa do Vaticano para a construção do ginásio Palhoção. Preocupado com os rumos da juventude palhocense, proferiu palestras nas escolas do município alertando sobre os malefícios do uso de drogas. Possui um livro de poesias e crônicas, publicado em 2014, denominado “Meus Sonhos na Janela”. Fonte: Arthur Nahas Neves
Dr. Juarez na Câmara e Vereadores instalada na antiga Prefeitura
Foto: acervo da famíla
Hermes D’Alincourt Nahas (in memorian) nasceu em 1933 e morreu por volta de 1934 ainda bebê por conta do sarampo (antes do pai e da vinda da família para Palhoça). Recebeu esse nome em homenagem ao amigo de Nicolau, coronel da PMSC Hermes Severiano D’Alincourt Fonseca.
Vida profissional e cultural de Nicolau Nagib Nahas
Exerceu distintos cargos profissionais na vida pública: Oficial de Registro Civil (1918-1929); Escrivão do Juízo Federal; Escrivão do Crime; Escrivão do Cível; Escrivão da Justiça Militar da Força Pública (1920-1928); Oficial do Registro de Títulos e Documentos (1920-1929); Recenseador da população de Florianópolis, segunda zona, (1920); Funcionário das Obras do Porto de Florianópolis1(929); Oficial Comissionado da Força Pública do Estado- Ajudante de Ordens do Cível Hermes d’Alicourt Fonseca (1932); Gerente do Balneário Canasvieiras (1931-32); Cartorário do Arquivo Público (1932); Investigador da Delegacia de Polícia (1932).
Apesar de sua curta passagem terrena, Nicolau Nagib Nahas foi fecundo produtor literário, poeta e ator de teatro, sonhador, expressou sentimentos e emoções. A intensa vida cultural lhe deram amigos influentes na sociedade catarinense, como: Antonieta de Barros, Delminda Silveira de Sousa, Ildefonso Juvenal da Silva, Trajano Margarida, Osvaldo Mello, Othon da Gama d'Eça, Índio do Brazil, Altino Corsino da Silva Flores, Leocádio Correia, Hercílio Luz, José Boiteux, entre outros. Sua sensibilidade poética enriqueceu colunas de jornais, periódicos, folhetins, livros de poesia e peças de teatro. Antonieta de Barros, primeira parlamentar negra eleita no Brasil, brilhante educadora, era sua admiradora, em 1927 solicita algumas obras de Nahas, através de um bilhete. Foto abaixo: Acervo pessoal do bisneto Arthur Nahas Neves.
Em “Meus Apontamentos Particulares” (material gentilmente cedido por familiares), Nicolau Nagib Nahas deixa registrado sua extensa carreira cultural e literária: Foi Presidente do Centro Literário Castro Alves (1915); Orador do Clube 12 de Outubro Estreito (1920-21); Orador do Clube 15 de Outubro (1922-1928-1932); Orador do Clube Sportivo (1923); Orador Centro de Cultura Teatral (1929) e Presidente (1932-33); Orador Clube Democrático Estreito (1929); Orador na fundação do Avaí Futebol Clube (1923), aclamado pela diretoria do clube como orador oficial em 1925, (foto ofício abaixo); Fundador e tesoureiro do Centro Catarinense de Letras (1925- 1926); Bibliotecário do Centro Concórdia (1923); Orador Esporte Clube Guarani de Palhoça (1932); Fundador do Centro Dramático; Fundador do Partido Liberal. Sócio de vários clubes esportivos: Lira Tênis Club, Clube Concórdia, Clube 12 de Agosto, Clube 15 de Outubro, Liga Operária, Clube Náutico Martinelli, Clube 5 de Novembro - Estreito.
Fonte: Acervo da família.
Nicolau Nagib Nahas participou voluntariamente de manifestações litero-culturais em favor de várias entidades caritativas: Maternidade Doutor Carlos Corrêa, fundada em 1927; Clube Martineli; Centro Catarinense de Letras; em honra ao Dr. Adolpho Konder; Em prol da viúva do jornalista morto, Crispin Mira, morto por desafetos políticos, etc. Associado da Irmandade Senhor Jesus dos Passos de Florianópolis, entidade destinada às obras de misericórdia.
Em 1926- fez papel principal da Revista Jazz-Band de Henrique Boiteux; Revista Ouro sobre azul e Revista Ilha dos Casos Raros em 1927.
Além de atuar principalmente na capital de SC, Nahas foi redator de jornais e revisas em outros estados da federação: Revistas A Semana (1912); Revista Ilustrada (1918); A Sulina de Curitiba (1921); Diretor da Revista Ilha Verde (1930). Jornais: República; O Tempo; A Verdade; A Notícia; A Voz do Povo; O Imparcial; O Estado; Folha Nova; O Dia; O Cinema; O Palhaço; O Elegante; O Clarim; O Catarinense; O Bisturi; O Judas; A Folha Rósea; A Época; O Direito; A Tarde, de Laguna; O Itiberê, Revista de Paranaguá (PR); O Itararé (SP); O Natal e A Sulina de Curitiba; Revista A Tarde (Curitiba); O Cedro e Democracia de Porto Alegre; Revista Acadêmica do Centro Catarinense de Letras; Vida Ilhoa; O Correio de Orleans, O Olhar de Laguna. Publicou também Guia Popular contendo tarifas Postaes e Telegraphicas e Tabella de Conferencias da Companhia Telephonica Catharinense em junho de 1932
Obras Literárias de Nahas
As primeiras obras literárias de Nicolau Nagib Nahas foram na juventude, aos 18 anos de idade escreve “Prelúdios Vespertinos” (1916) e “Hosanas” ao Estado de Santa Catarina dedicado ao ilustre catarinense José Arthur Boiteux (1916). Na sequência escreveu “Canções Incultas” (1922), “Boas Festas” (1932: “Versos de Minha Vida” publicado post-mortem pela família (1947). Para o teatro compôs “Ilha dos Casos Raros” (Revista) (1927), “BemDito Amor” (Melodrama) (1932), “A Cruz “(Entreato). (Grafia original- fornecido por familiares).
Capa de “Hosanas ao Estado de Santa Catharina”.
Fonte: Acervo bisneto Arthur Nahas Neves.
Cultura interrompida
A radicalização político-partidária e ideológica da década de 1930 contribuíram para interromper a produção cultural de Nahas, antes de ser acometido por tuberculose, aos 35 anos de idade. O contágio provocado pela enfermidade levou a família incinerar “Prelúdios Vespertinos” e as peças “A Cruz” e “BemDito Amor”, impedindo o conhecimento da obra na posteridade. Em respeito a infinita saudade, a viúva e filhos publicam em Palhoça “Versos de Minha Vida” no ano de 1947.
Programa da Peça “BemDito Amor”.
Acervo de Arthur Nahas Neves.
As obras de Nicolau Nagib Nahas é um legado importante para a literatura catarinense.
Em 1916, com apenas 18 anos de idade, Nahas escreve o poema “Hosanas” dedicado ao Ilustre catarinense Dr. José Arthur Boiteux, grande intelectual catarinense, secretário de Estado do governador Hercilio Luz, homenagem ao retorno do 5º Congresso de Geografia na Bahia. Fundador em 1920 da Sociedade Catarinense de Letras que originou, em 1924, Academia Catarinense de Letras, e, entre outras atribuições, contribuiu para a criação do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina (IHGSC) fonte: https://www.acletras.org/
Hosanas: (Obs. grafia de acordo com o original)
Feliz, e bem feliz, oh! terra minha,
Por seres o primor de todo o sul;
Por dar-te Deus os louros de rainha,
E dar-te um céo puríssimo de azul.
Feliz porque possues homens de glórias,
Heroes cingidos de laureis, infindos!
Filhos ilustres, cheios de victórias,
Que a tua História há de lembral-os rindo
Feliz, és bem feliz, não tens riva!.
Possues da Natureza todo encanto;
Todos te rendem pleitos sem ter mal,
E entoam teu hymno a rir, n’um canto!
“Canções Incultas” obra publicada em 1922 e prefaciada pela amiga escritora Delminda Silveira de Sousa. O talento do jovem Nahas expressa nos versos, de forma muito natural, diversas emoções: dor, saudade, tristeza, esperança e amor à cidade que adotou de coração. “[...] “Canções Incultas” derramam o sentimento contido no coração de um jovem órfão do maternal amor, contrariado nas suas nobres e belas aspirações... Esse terno coração deve, por força, conhecer, ter experimentado as doçuras de um affecto santo e a dor, a tristeza, a amargura, a saudade de tudo haver perdido!... Este Sympathico jovem patrício é, por todos os respeitos, digno de agrado e proteção despendidas com todos aquelles que se distinguem unicamente pelos seus nobres esforços e merecimento. [..]” assina a patrícia e admiradora Delminda Silveira. (Grafia original do Livro-Canções Incultas)
Quando te fôres
[...]
Quando chegar a hora da partida
E eu do adeus sentir o golpe fundo,
Então será bem triste a despedida!
Vã piedade.
[...]
Embora a alma viva ferida,
Eu saberei sofrer sem o vosso alento
Como quem sempre triumphou na vida!
Vinte e ter anos!
[...]
Um anno mais na vida...mais um anno
De luctas collossaes!
Um anno, um anno mais
Luctando entre magua e oo desengano
Fóge a esperança e o amor, e a mocidadae
Deserta, a soluçar,
Com o peito a palpitar,
Canta baixinho o psalmo da saudade!
[...]
“Canções Incultas” livro comemorativo ao Centenário da Independência do Brasil exata a belezas naturais e as Reformas Modernistas da antiga província, iniciadas pelo amigo governador Hercílio Luz. (Grafia original do Livro-Canções Incultas)
Independencia ou morte
[...]
Patria minha sublime! Terra Santa
Onde nasceu para encantar o Mundo
Um novo Sól de brilho incomparável!
Qualquer outra Nação não te suplanta,
Porque entre os mais, teu sólo é o mais fecundo,
Fértil, sem igual, de ouro inexgotttavel!
Dr. Hercílio Luz
Luctador incansável!
Coração que traduz sublimidade;
Alma justa e amorável
Onde se aninham o amor e a caridade!
A alma do povo, em doce idolatria,
Sempre vibrando de enthusiasmo e ardor,
Cheia de orgulho e cheia de ufania,
Ao teu nome de grande empreendedor
Há-de sempre aclamar
E respeitar!
Tu nunca morrerás! A nossa História
Há-de cantar em versos d’oiro a Gloria
Que hoje circumda a tua fronte augusta!
E elevará mais tarde ao firmamento,
Tua effigie, num grande monumento,
Como uma homenagem muito justa!
Julho de 1922
Capa do Livro “Canções Incultas”.
Acervo bisneto Arthur Nahas Neves.
Nicolau Nagib Nahas: Primeiro Catarinense Modernista
Para entender o Modernismo no Brasil é necessário voltar no tempo e conhecer o contexto histórico envolvendo esse movimento cultural iniciado na Europa. No Brasil, ocorreu a partir da Semana da Arte Moderna de 1922, em São Paulo. Marcado pela efervescência de novas ideias no campo das artes e literatura num momento em que o Brasil passava por grande insatisfação política; representou um divisor de águas na cultura brasileira. As novas experiências literárias e artísticas utilizam o humor e a sátira em forma de versos livres ou rimados para criticar o tradicional e a realidade cotidiana local ou regional. Essa ressignificação questiona diversos temas: ecologia, política, ciências, sexualidade, relações sociais, ética, entre tantas outras abordagens. A partir desse movimento ocorre a mudança política, econômica e cultural da sociedade brasileira. Num olhar minucioso presume-se que Nahas refutou os preceitos das regras sociais vigentes e embarcou destemido nas diversas fases do Modernismo brasileiro estabelecido, anteriormente, no eixo Rio-SP. Novidade em Santa Catarina, as características modernistas são abordadas em 1926 na revista e no teatro com o Espetáculo: “Ilha dos Casos Raros”
O autor expôs a realidade social e política da capital catarinense de forma crítica e irônica usando sátiras, paródias e linguagem coloquial. Reconhecido pela professora de Língua Portuguesa, Mestra e Dra. em Educação, Tânia Piacentini, como “um dos primeiros autores modernistas de SC, talvez o pioneiro”. Segundo ela, Nahas é modernista quando trabalha com alegorias e apresenta no palco personagens vivendo diversos panoramas da época. O nacionalismo e a preocupação social permeiam a poética do autor, além disso a valorização do “local em que vive” é uma das características do modernismo, pondera a professora.
O Grupo de Poetas Livres – Conceituada entidade Literária de Florianópolis – SC – classifica os versos de Nahas de sonetos, gênero lírico sonoramente formado de rimas e métricas. “Há muita poesia de circunstância, celebrando momentos patrióticos, personalidades ou membros familiares. Depreende-se de muitos poemas seus uma grande fé e confiança em Deus, ao lado daqueles momentos de pessimismo, como também manifesta seu profundo sentimento de solidariedade” (Grupo de Poetas Livres)
Ativo em várias sociedades literárias, Nicolau Nagib Nahas era reconhecido por suas crônicas sociais e poesias publicadas nos principais jornais de Florianópolis. Respeitado entre intelectuais e políticos por seu talento na oratória, estava sempre presente em comícios e eventos sociais dos grandes clubes da capital. Estimulado pelas vanguardas europeias, Nahas mergulha no gênero teatral e, escreve a Revista intitulada “Ilha dos Casos Raros”.
Popularizada nas 25 cenas apresentadas no teatro Álvaro de Carvalho. A primeira apresentação foi em 1º de setembro de 1927, pelo sucesso, a peça foi reapresentada em 7 de setembro, em honra ao ex-governador Dr. Adolpho Konder e pela sexta vez em 15 de setembro do mesmo ano. Para conhecimento dessa História relacionada ao município de Palhoça, do Estado de SC e do Brasil, cópia de obras e da revista “Ilha dos Casos Raros” foram gentilmente cedidos por Arthur Nahas Neves, bisneto do escritor Nicolau Nagib Nahas e neto do querido palhocense, ex-promotor, Dr. Juarez Nahas.
A Revista no Teatro Álvaro de Carvalho: “A Ilha dos Casos Raros”
Na dramatúrgica revista “Ilha dos Casos Raros” os personagens encenam fatos reais e mazelas sociais da capital catarinense que entre risos eram prazerosamente aplaudidos pelo público pagante. No palco a demonstração do contraste social, a antiética política, os hábitos e comportamentos da antiga província Desterro causou repercussão na elite e polêmica nas autoridades do estado. É nesse contexto que em 1927, Nahas e seus atores expressam características modernistas brasileira, anterior ao Grupo Sul dos anos 1940/50, denominado por alguns estudiosos, precursores do modernismo em SC.
Voltamos à História do Brasil, início do século XX, para entendermos o regime político controlado pela oligarquia. Eram pequenos grupo de pessoas pertencentes ao mesmo partido, classe ou família que detinham o poder. Nesse clima, ocorria à luz do dia, a corrupção, a coerção e compra de votos das pessoas mais humildes, submetidas a votar nos indicados por cabos eleitorais. Essas mazelas sociais, entre outras abordagens sobressalientes foram sabiamente retratadas na Revista literária “Ilha dos Casos Raros” de Nicolau Nagib Nahas sob a forma de quadrinhas populares, números musicados, diálogos, cantos e declamações. O autor ironiza e satiriza com autonomia e liberdade determinadas autoridades, políticos, falsos intelectuais, bêbados, policiais, jovens esnobes e o controle da liberdade de imprensa. Também não fez vista grossa aos costumes sociais, empreguismo na máquina pública, inclusive corrupção interna do Partido Republicano Catarinense, do qual pertence.
Na SCENA XVI da revista o autor condena o sistema eleitoral vigente e reivindica o voto secreto no Brasil. Cem anos depois, sua poética continua atual, indaga-se as mesmas questões sociais da época em que o escritor viveu. Sabe-se que o eleitor votava em quem o alistava, hoje o eleitor vota em quem dá cesta básica, carrada de barro, gasolina e outros benefícios...Vejamos abaixo o poema com grafia original da revista “A Ilha dos Casos Raros”.
Nós somos os eleitores
Dessa terra bem amada,
Jamais puzemos na urna
Uma só chapa furada
Quem me alistou foi seu Branco,
Meu voto a ele pertence.
Quem ao seu Branco acompanha
Pode estar certo que vence.
Eu sou oposicionista,
Escólho meu candidato,
Se perde ou ganha, que importo,
E nada de espalhafato!
Por isto ando sempre prompto,
Só com o pão de cada dia,
E isto porque eu amo
A Deusa SOBERANIA!
Na capôera só bicho,
Só bicho no arrastão;
Sabe quem escoe em quem voto?
O Herminio do Ribeirão.
Escrevê não sê, mas voto
E voto inté quem já morreu.
Que o diga seu Vito Fange
E o sinhô Senen Cameu.
Então o senhor é eleitor?
Sô sim sinhô. Quem me alistou agora foi o Dr. Abelardo Luz, para as inleição de Deputado Federá. Os meus Papé tão em órde, sim sinhô. Em Cannasvieira o sinhô Roselindo não anda muito bom não sinhô. Carqué dia a bomba arribenta mêmo...
As urnas, Eia! ...
Vamos todos á porfia;
Se o voto Secreto vem
Seremos coisa algum dia!
SCENA IV: Na seguinte alegoria, Nahas, exalta a qualidade da nossa água mineral.
Sou água pura e gostosa,
Tenho em tudo distincção;
Sou preferida. Sou filha
Das Caldas do Cubatão.
O meu nome é daquela,
Que uma raça fez feliz;
Sou a água mineral
Mais querida: A Impreratriz
Na mesma cena o autor Nahas denuncia a fraude do leite de vaca misturado com água e vislumbra o futuro da economia do Brasil na produção cafeeira, malograda com a grande depressão econômica mundial de 1929, quando ocorre a quebra da Bolsa de Valores de Nova York e diminui a exportação do café, principal representante da riqueza brasileira na época. (Grafia original da revista “A Ilha dos Casos Raros”)
Sou o café sem mistura,
Sem milho, gostoso e puro;
No Brasil sou hoje a glória
E a riqueza do futuro!
Sou o café mais querido,
De fina torrefação;
Café Bruno, preferido,
De toda a população.
Eu sou o leite bebido
Com o café misturado
Nada velho. Gósto tanto
Quando puro sou tomado.
Sou muito falsificado,
Esta é a minha maior magua:
Sou leite só dez por cento
E noventa sou água...
Café diz: Eu sou o café sem mistura.
Água diz: Eu sou a água desejada.
Leite diz: Eu sou o leite com água.
Forasteiro: Que mistura desgraçada!
Na SCENA XXIII - Nahas faz uma Sátira com os elementos: Polícia, forasteiro e Ilha. Em tempos sombrios para a democracia brasileira; jornalistas eram mortos por desafetos e agredidos por policiais munidos de cassetetes, aqui denominado de “pauzinho”, o autor aproveita para criticar o consentimento do tal objeto pelo comando da Polícia.
Entra em cena a polícia com pauzinho na mão e canta: (Grafia original da revista “A Ilha dos Casos Raros”)
(Polícia) Não me jurgue coisa má
Nem em mim vejam malícia;
Não zombem de mim, nem brinquem
Com o pausinho da polícia.
Sô sordado e cumpro as orde,
Trato a todos com brandicia;
Se brigarem... então lá váe
O pausinho do policia.
[...]
A Ilha responde ao policial: É um melhoramento muito útil e que evitará, estou certa, muitos desastres. O Dr. Cid Campos deixou bem assignalada a sua passagem pela chefia da Polícia.
O forasteiro diz: É verdade dona Ilha. É um melhoramento indispensável. E eu lhe felicito, meu guapo e sympathico policial. Que o seu pausinho obedeça a Lei e tudo correrá muito bem. Não abuse nunca da autoridade e do valor do pausinho. Lembre-se que a justiça é céga, mas ouve perfeitamente bem e não perdôa nunca os que abusam da sua protecção e os que mal interpretam a sua Lei. (grafia original “Ilha dos Casos Raros”)
[...]
Liberdade do porrete- Liberdade de Pensamento e da Justiça.
Nahas aborda as denúncias de irregularidades nas obras federais do porto de Florianópolis e uso do cargo público para benefício próprio. Motivo pelo qual o jornalista Crispim Mira foi atacado na redação do seu jornal “Folha Nova” por um grupo de desafetos armados com relho e revólver; a agressão o levou a óbito no Hospital de Caridade em 5 de março de 1926. A tentativa do ‘cala boca’ ao jornalista em Floripa teve repercussão em todo território brasileiro e, na peça apresentada no Teatro Álvaro de Carvalho, o público entendeu o significado, aplaudiu com vigor. (Grafia original da revista “A Ilha dos Casos Raros”)
(Liberdade do porrete declama:)
A liberdade eu sou
Do cobarde o porrete,
Primo irmão do cacete
Que não teme arreganho
Nem a justiça teme...
Vendo-me o povo treme,
Pois sou de bom tamanho.
Liberdade do pensamento:
Eu sou a liberdade
Do Pensamento- a imprensa,
Que age, trabalha e pensa
E aos crápulas, condena;
Sou o clarim da glória,
Do povo a anseio asculto!
Para a ameaça e insulto
Minh’arma e esta: A PENNA
(A Justiça diz:)
Bem aja quem me fez céga,
Só assim não posso ver
As injustiças sem nome
Feitas já e por fazer...
Céga não posso julgar,
Si bem que ouço os gemidos
Dos tristes, dos oprimidos
Que passam miséria e fôme;
Si bem que ouço os lamentos
De milhares de detentos
Que clamam pelo meu nome!
Quizéra, antes, ser surda!
Mil vezes, sim, a surdez!
Quem foi que céga me fez?
Ouvir gemidos e ais,
Ouvir lamento sem fim,
Vezes que bradam por mim
Supplicando amparo e paz!
E, no entanto, os meus interpretes
Não ouvem a minha vóz
Numa indifferença atróz
Jogaram-me ao esquecimento!
Quantas vezes a innocência
Tem supportado a inclemência
De um errado julgamento!...
JUSTIÇA: Pobre de mim!
A minha Lei só se applica
Aos pobres; que a gente rica
Jamais de mim precisou!
JUSTIÇA- flôr desfolhada
Cuja raiz malfadada
O gelo do ÓDIO crestou!
Homenagem ao Governador Hercílio Luz
Na poesia intitulada Dr. Hercílio Luz, Nahas o exalta de forma patriótica. A admiração por Hercílio Luz está expressa na SCENA XXV da revista “A Ilha dos Casos Raros”, onde as obras modernistas, as reformas urbanas, arborização da cidade, saneamento do Rio da Bulha, construção da Avenida Hercílio Luz e a construção da Ponte Hercílio em 1926, são enaltecidas pelo autor. Na cena, o diálogo se dá entre a Ponte, o Forasteiro e a Ilha, ideias expressas de modo figurado, características do modernismo dos anos 20. (Grafia original da revista “A Ilha dos Casos Raros”)
Aqui estou eu. Sou a graça,
Da Ilha e do Litoral;
Sou a vida e o movimento
Desta linda Capital!
Fui um sonho secular
Que se fez realidade;
Encanto a todos. Sou a força
De trabalhos de Vontade!
O esforço ingente e a vontade
De Hercílio Luz- Estadista
Deram-me a vida com ella
A Fama, a Glória e a Conquista!
A ILHA diz: “ Pena é que fôsses explorada por uma sociedade anonyma, que comeu parte dos teus lucros e dos teus proventos...“ (Grupos exigiam pagamento de pedágio no lado continental da ponte, para que o povo transitasse entre a ilha e o continente, entre outros acontecimentos..).
A Ponte: Então, que tal acha esta portentosa obra de engenharia, esta imensa estrada de aço, sonho secular do povo barriga-verde?
Forasteiro: Magnifica! Extraordinária! Bemddito seja aquelle que teve o desassombro e a energia de ser o iniciador de tão grandiosa obra!
A PONTE responde: “E sabem por que aqui me encontro? Sou filha e do esforço da vontade daquelle homem (aponta par ao retrato do Dr. Hercílio Luz) Sim, sou filha daquelle homem que, se teve o ímpeto e a energia de um vendaval; se foi às vezes enérgico demais; foi, também, calmo e tranqüillo como um dia claro de sol ardente, foi tambem manso como um cordeiro. É a elle que tu, o Ilha encantada, deves o saneamento das tuas ruas, a belleza das tuas avenidas e a glória na Política da tua gente moça a quem elle legou os mais nobres e salutares ensinamentos”.
“E a morte! como é injusta a morte! não quis, que elle visse a sua immensurável obra depois de concluída e entregue ao transito do povo que o fizéra de ídolo muito amado e querido”. (Texto original de 1928) (Grafia original da revista “A Ilha dos Casos Raros”)
Na cena final quatro senhoritas cantam:
Salve, Egregio Estadista,
A tua santa memoria,
Será sempre relembrada,
Nos annaes de nossa História!
Transformastes num jardim
Esta Ilha idolatrada
Que no Estado se apresenta
Mais formoso que uma Fada!
Esta Ponte é um monumento
De uma eterna gratidão
Ao político, ao Estadista
Que ao Estado honrou e á nação!
Esta obra portentosa,
Esta Ponte Collossal
Fez unir o Continente
Num abraço á Capital!
Na SCENA XXI – O autor enaltece a beleza da cidade, nem por isso, Nahas deixa de ser crítico com o malcuidado das ruas, praças e com a lentidão de obras importantes da cidade. Também critica o mal estado das estradas e da Avenida Hercílio Luz. Na cena, uma senhorita vestida com elegância que entra cantando:
Avenida Hercíciol Luz,
Plena de encantos e graças;
Sou eu que animo e dou vida
A s nossas ruas e praças.
Toda ella arborisada,
Com farta iluminação.
Da Ilha dos casos raros
Seu encanto e seducção!
Quem dera os bonds electricos
Para me dar maior vida;
Então terei os progressos
Mais próprios de uma avenida.
A Ilha fala: Estamos, sr. Forasteiro, na Avenida Hercílio Luz, que, apesar de esburacada e maltratada, é a mais linda das nossas avenidas.
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O jardim da Praça XV de Novembro, denominado pelo autor de Jardim Oliveira Bello, recebe grande destaque, mas Nahas não poupou críticas ao abandono do local onde foi exposto o busto do destacado Simbolista brasileiro, o escritor Cruz e Souza e às intermináveis obras de aterramento do Porto da antiga Desterro, obra acusada de corrupção... (versos grafia original do autor)
Jardim Oliveira Bello,
Tão cheio de tradições!
Nestas minhas alamedas
Prendi muito corações.
À sombra divina e doce
De minha innorme figueira
As almas atribuladas
Gosam uma paz verdadeira!
Sáo belas as minhas arvores
E as minhas flores variadas.
Para o amôr me procuram
As almas enamoradas!
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Jardim : Sou encanto e a graça desta Ilha adorada. Quantos casamentos foram promettidos á sombra acolhedora e amiga das minhas arvores frondosas. E quantas esperanças e quantas desillusões estão espalhadas nas minhas alamedas...
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Ilha: Bondade de sua parte. Este jardim é o ponto predilecto onde se reúne a fina flôr da sociedade catharinense. Tenho ainda outros jardins bem tratados, com monumentos e flores. O pior, porem, o que mais depõe contra o menosprezo dos nossos dirigentes, é o jardim onde collocaram o busto do poeta dos Missaes e dos Ultimos Sonetos.
Forasteiro: Isto e uma pena, D. Ilha. Cruz e Sousa num...
Que fazem aqui as Obras Publicas?
Ilha: O que faz todo o Mundo...Recebe os vencimentos a que tem direito e o mais... tudo aqui anda a passos de cágado, como as obras do Porto, de saudosa memoria...
Obras do Porto: Eu sou as Obras do Porto,
Velho já desconsolado,
Quanto mais eles me aterram,
Fico mais desaterrado...
Se aterrei alguma coisa,
Eu devo ser verdadeiro!
Agradeço unicamente
Ao trabalho do lixeiro...
Se aterro ou desinterro,
Se trabalho muito ou não
Não sei dizer; eles dizem
Que vou enterrando a nação
Ilha: Eis porque me chamam a Ilha dos casos raros e mysteriosos...
Meio de vida vitalícios, D. Ilha...
É verdade. Meios de vida como as conservações de estradas, as construções de pontes, as pinturas de edifícios públicos, os jogos de azar, etc, etc. (Grafia original da revista “A Ilha dos Casos Raros”)
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Tendo como referencial o Rio de Janeiro, na época capital brasileira, o gênero teatro de revistas era o que tinha de mais refinado na literatura florianopolitana na década de 1920.
Intelectuais da Academia Catarinense de Letras e do Centro Catharinense de Letras, este fundado por Nahas, escreviam revistas teatrais e encenavam no Teatro Álvaro de Carvalho, fundado em 1875 com o nome de Teatro Santa Isabel. Mais tarde, em 1894, por decreto, mudou de nome para Teatro Álvaro de Carvalho, em homenagem ao primeiro-tenente da Marinha e primeiro dramaturgo catarinense que havia morrido heroicamente durante a Guerra do Paraguai.
Durante a década de 1920 as apresentações culturais no teatro passaram a ser a principal diversão da juventude e ponto de encontro dos intelectuais. Sob a ótica do autor e ator da Revista “Ilha dos Casos Raros” foram apresentadas cenas abordando acontecimentos político-sociais e costumes vivenciados por moradores da capital catarinense no início do século XX. Os temas retratados por Nicolau Nagib Nahas, continuam atuais no nosso cotidiano social. Que tal, resgatar a História da Revista “Ilha dos Casos Raros” no mesmo Teatro.?
Por: Neusa Bernado Coelho- Escritora-Historiadora